Coisas que me irritam solenemente #

23:28

A facilidade com que o Gui adormece.



Juro! É uma canseira! Aquele homem adormece tranquilamente em qualquer ocasião, com qualquer estado de espírito. Seja depois de uma discussão à qual eu quero dar continuidade. Seja quando eu lhe digo que não aguento com dores nos ossos. Seja quando eu estou visivelmente irritada com qualquer coisa e preciso de o ver igualmente irritado para me sentir na necessidade de o acalmar e, assim, deixar de ser a pessoa que está irritada para passar a ser a que está a acalmar a que se irritou (e digo-vos, ele é que ainda não percebeu isto, porque se tivesse percebido fingia-se irritado só para ficarmos todos felizes). Não importa o que esteja a acontecer dentro de casa, lá fora no pátio ou ao longo do Planeta Terra, que aquela alminha consegue deitar a cabeça na almofada e dormir um belo sono. 

"O parvalhão aqui do lado está outra vez aos berros às duas da manhã, Guilherme!", digo eu, com três veias a querer saltar-me do pescoço, tais são os nervos que revelo na cara bochechuda que aparece depois do meu roupão cor de rosa de chinelos a condizer. "Este gajo é mesmo idiota", é o que se ouve da boca dele, que foi a única coisa que se abriu, dado que os olhos continuam fechados a anunciar que o dono vai adormecer dentro de segundos. Eu, na minha contínua esperança de que algum dia ele se levante e mexa um músculo que seja, faço questão de andar a bufar de um lado para o outro, certificando-me que todos os meus movimentos são bruscos e os passos brutos. Não só para dar a entender ao idiota que mora aqui ao lado que estou farta de acordar de madrugada por causa dele, como também para assustar o meu próprio namorado, esperançosa de que isso o faça sentir-se pressionado a fazer qualquer coisinha (nem que seja só mostrar-se irritado!).
Mas não. É em vão qualquer esforço, porque o desgraçado dorme, continua a dormir, e eu fico a sentir-me ridícula por parecer ser a única pessoa à face da Terra que tem problemas com o facto de não conseguir ter sossego devido a um atraso de vida que decidiu vir morar mesmo colado a mim.

"Guilherme. Aquele tanso está outra vez a meter-se comigo", anuncio eu, noutro dia qualquer, esforçando-me por ser uma namorada correcta que, nada interessada em qualquer outro ser humano, conta ao namorado o quanto está chateada com as constantes investidas de um mostrengo qualquer. "Porra...! Esse gajo é mesmo idiota", balbucia ele, de novo a mesma frase, deixando-me ansiosa pelo momento em que vou ver uma das sobrancelhas dele a mexer-se um segundinho que seja. E espero. E espero. E espero. E esperei demais, porque ele voltou a adormecer. "Guilherme! Acorda! Ele continua!", insisto, enquanto o abano e faço questão que abra os olhos para lhe mostrar mais uma das vinte mil mensagens que o mostrengo insiste em enviar, sem perceber que está fora da manada. O Gui lá abre os faróis muito a custo, pisca-os devagar com cara de embriagado, grunhe qualquer coisa que deveria servir como um conselho ou algo que me ajudasse...mas eu nem sequer percebo, porque ele nem acaba a frase e volta a dormir.

"Pois! Dizes isso porque estás interessado em ficar todo amiguinho com ela!", ouve-se algures pelas 22h30, quando o (até então) romântico casal deveria estar pronto para dormir, mas deixou de estar porque entretanto surgiu uma conversa qualquer que envolve ataques de ciúmes e acusações mútuas. "Não estou nada, deixa de ser assim!", riposta ele, esperando que eu diga o quanto sou parva por ter ciúmes tolos, sem perceber, no seu inocente e limitado cérebro masculino, que eu nem acho mesmo o que digo, mas digo na mesma só para o ouvir dizer que é mentira (coisas de gaja). No entanto, da minha parte só obtém um "Pois." muito sarcástico e pouco amistoso, seguido de braços cruzados, silêncio absoluto e cara de "não-falo-mais-contigo". Isso, por si só, deveria servir para o deixar nervoso, chateado e com necessidade de esclarecer o assunto...mas não. Ele dorme, simplesmente. Fecha os olhos e dorme.

E seja qual for o motivo, quer eu lhe mande umas dicas sobre o facto de estar a precisar de mimos extra, quer o alerte para o facto de dali a meia hora termos que estar não sei onde, quer esteja a haver um apocalipse de zombies lá fora, aquele rapaz consegue não se desfazer das suas qualquer-coisa-como 14 ou 15 horas de sono diário e desconfio seriamente que, ou arranjo forma de ir para a maternidade com antecedência, ou todos os meus partos serão caseiros e ao abandono do pai das crianças, que se recusou a acordar para chamar uma ambulância.

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2 comentários

  1. No caso de um apocalipse zombie acho que seria diferente, afinal vocês já treinaram técnicas para acabar com eles :P

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